A INCONSTITUCIONALIDADE DE IMPOR LIMITE NA
DEDUÇÃO DE VALORES REFERENTES A DESPESAS EDUCACIONAIS DO IMPOSTO DE RENDA DA
PESSOA FÍSICA
THE UNCONSTITUTIONALITY TO IMPOSE
LIMITS IN THE VALUE
DEDUCTIONS RELATED TO EDUCATIONAL DEBTS
FROM THE INCOME TAX OF A NATURAL PERSON
RESUMO: Sobre o
imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza está enraizado um
problema que afeta a concreta efetivação da justiça social, uma vez que possui
a nítida função de redistribuir a renda e propiciar a todas as regiões um
desenvolvimento econômico capaz de superar os desequilíbrios e, efetivamente, gerar
uma eficácia real-material. Neste viés, a limitação da dedutibilidade
das despesas educacionais prevista no art. 8º, inciso II, alínea b, itens 7, 8 e 9, da na Lei nº
9.250/95, coloca em choque o direito social à educação que é direito de todos e
dever do Estado, caracterizando-se como inconstitucional, haja vista que tais
despesas caracterizam-se como essenciais à vida do cidadão. Por conseguinte, o
presente estudo se propõe a construir uma reflexão do rol de direitos sociais
estampados no Texto Constitucional, analisando os princípios constitucionais
como mecanismos legitimadores de uma vida digna, com condições humanas dignas, a
partir da inconstitucionalidade na imposição de limite na dedução de valores
referentes a despesas educacionais do imposto de renda da pessoa física, decorrente
da omissão estatal ao não propiciar o direito à educação a todos os cidadãos.
Palavras-Chave: Despesas Educacionais. Inconstitucionalidade.
Direitos Sociais. Imposto sobre a Renda. Vida Digna.
ABSTRACT:
About income tax and earnings of any nature, there is a basic problem that
affects the concrete realization of social justice, since it has a clear role
to redistribute income and provide to all regions an economic development able
to overcome imbalances and effectively generate an effective real - material. In
this way, the limitation of the deductibility of educational expenses provided
for in art . 8, section II, paragraph b , items 7 , 8 and 9 of the Law No.
9.250/95, puts in evidence the social right to education that is the right of
everybody and the State duty, characterizing as unconstitutional, since such
expenses are characterized as essential to the citizen’s life. Therefore, this
study aims to construct a reflection of the social rights list presented in the
Constitutional Text, analyzing the constitutional principles as legitimating
mechanisms of a decent life, with decent human conditions, from the unconstitutionality
in the limit imposition on the deduction of values related to educational
expenses of the individual income tax, as a result of the state omission by not
providing the education right for all citizens.
Keywords:
Educational Expenses. Unconstitutionality Social Rights. Income Tax.
Decent Life.
SUMÁRIO
Introdução. 1 O Imposto Sobre A Renda E Proventos
De Qualquer Natureza. 1.1 O Conceito
Constitucional De Renda E Sua Necessária Eficácia Real-Material. 1.2 A Dignidade Humana Como Premissa De
Um Imposto De Renda Justo E Eficaz (Não Meramente Arrecadador). 2 A Dedução Vigente Na Lei Nº 9.250/95
E A Violação Dos Princípios Constitucionais Tributários. 2.1 Princípio Da Capacidade Contributiva E A Imprescindível
Observância Do Mínimo Vital. 2.2
Princípio Da Proporcionalidade E Razoabilidade Como Critério Limitador Ao
Direito De Tributar. 2.3 Princípio
Do Não-Confisco E A Importância Latente Do Dever Fundamental De Pagar Impostos.
3 A Inconstitucionalidade De Impor
Limite Na Dedução Dos Gastos Com Educação: Uma Análise A Partir Do Enfoque
Constitucional Ao Direito À Educação Oriunda Da Omissão Estatal Em Possibilitar
O Real Direito À Educação. 4
Conclusão. 5 Referências
Bibliográficas
INTRODUÇÃO
Estabelecido num Estado Democrático de Direito, oriundo – principalmente
– da promulgação da Constituição Federal de 1988, o Brasil possui previsão
expressa
de
assegurar o exercício dos direitos sociais
e
individuais de sua população. Nesta seara de direitos afirmativos, gestão
governamental e políticas tributárias viáveis que venham a possibilitar o
fornecimento desse rol de direitos sociais e individuais, nos confrontamos com
a obrigação estatal de instituir e cobrar impostos, sem, contudo, que estes
sejam apenas uma fonte arrecadadora.
Proveniente deste binômio, direito-dever do Estado, encontra-se
centralizado a questão da dedutibilidade das despesas educacionais no Imposto sobre
a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, uma vez que, da forma como se
encontra previsto na legislação vigente, Lei nº 9.250/95, em especial os art.
8º, inciso II, alínea b, itens 7, 8 e
9, tal dispositivo caracteriza-se
pela sua inconstitucionalidade, haja vista que estabelece valores irrisórios e
que não correspondem com a realidade atual da sociedade brasileira, bem como
que a caracterização do imposto de renda dá-se a partir do acréscimo
patrimonial do cidadão efetivamente
auferido pelo contribuinte num determinado lapso de tempo, sem o qual
inexistirá obrigação tributária.
Logo, o que nos compete
examinar é a relação de eficácia contida nos princípios constitucionais tributários,
a fim de averiguar se a legislação atual não extrapola sua competência, uma vez
que é preciso enfrentar e superar a natureza confiscatória do imposto de renda,
no intuito de proporcionar ao cidadão, contribuinte do imposto, uma condição de
preservar o mínimo existencial, sustentada – principalmente – a partir da
capacidade contributiva e o dever de pagar impostos, sem, contudo que isso seja
fonte de reprimir a real efetivação da justiça social. Isto é, faz-se
imprescindível uma relação de relativação necessária e obrigatória entre Estado
e cidadão, ao passo que o primeiro necessita do tributo como forma de
sustentáculo de sobrevivência, bem como necessita de tais recursos para atingir
seus fins governamentais, ao passo que da forma como se encontra determinado e
executado, acaba o cidadão, indiscutivelmente, sendo extremamente onerado, sem
a devida contrapartida.
Desta forma, cabe um
constante processo de redescobrimento e efetivação dos direitos sociais frente às
obrigações do Estado, para que possamos, de modo objetivo, afirmar ou não se há
inconstitucionalidade na imposição de limite na dedução de valores referentes a
despesas educacionais do imposto de renda da pessoa física, a partir de uma
suposta omissão estatal ao não propiciar o direito à educação a todos os
cidadãos, numa flagrante violação ao disposto nos arts. 6º e 205, da Carta
Constitucional.
Por tais razões, o
problema de impor limite na dedutibilidade das despesas com educação aqui
exposto se faz pertinente, a uma porque tais despesas são necessárias e
obrigatórias para uma condição digna de vida do cidadão e, tentar limitá-la
acaba por ser um ato de impropriedade, uma vez que não há acréscimo patrimonial
do cidadão; a duas, há uma clara violação aos princípios constitucionais
tributários, em especial, os princípios da dignidade humana, da capacidade
contributiva, da proibição de confisco e o princípio da razoabilidade; a três,
a omissão estatal em não oferecer mecanismos eficazes que visem proporcionar
uma educação satisfatória aos cidadãos, fere a consolidação
da teoria dos direitos fundamentais e sociais esculpidos no texto
constitucional, acarretando um prejuízo ao mínimo existencial do
cidadão-contribuinte, que vê o Estado subtraindo-o de forma desproporcional
aquilo que deveria oferecer (saúde, moradia, segurança, em especial aqui, a
educação), agravando sua renda de forma a prejudicar sua sobrevivência digna.
1 O IMPOSTO SOBRE A RENDA E PROVENTOS DE
QUALQUER NATUREZA
No auge
dos seus noventa anos
,
o mais pessoal dos impostos, o Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer
Natureza, justifica-se como instrumento de redistribuição de renda, buscando
manter em equilíbrio o desenvolvimento econômico das diversas regiões do país (MACHADO,
2008, p. 312/313), cuja competência pertence à União (art.
153, III, da Constituição Federal) e existirá sempre que o cidadão auferir
renda ou proventos de qualquer natureza durante o exercício financeiro.
1.1 O CONCEITO
CONSTITUCIONAL DE RENDA E SUA NECESSÁRIA EFICÁCIA REAL-MATERIAL
O
conceito de renda não está previsto de forma explícita na Constituição Federal,
mas isto não significa que pode o legislador ordinário dar entendimento
diferente daquele previsto no texto constitucional, em particular, aqueles preceitos
pautados implicitamente pela carta magna, ou seja, pelos princípios
constitucionais tributários.
Sobre o
tema, (PAULSEN, 2012), entre outros (PEIXOTO, 2005 e LEAL, 2008), afirma que na instituição do imposto, o
legislador ordinário não pode extrapolar a amplitude de tais conceitos, sob
pena de inconstitucionalidade.
O conceito de renda utilizado pelo Código Tributário Nacional para
caracterizar o imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza é tudo
aquilo que acrescer o seu patrimônio como um elemento novo e positivo, ou seja,
o que representar um acréscimo patrimonial ao contribuinte (CATÃO, 2005, p. 517).
Conceito este que está expressamente previsto no art. 43 (CTN), quando deste
modo determina:
Art.
43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer
natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou
jurídica:
I - de
renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de
ambos;
II -
de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais
não compreendidos no inciso anterior.
§ 1o A incidência do imposto independe da
denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou
nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção.
§ 2o Na hipótese de receita ou de
rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em
que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido
neste artigo.
A função
do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza é redistribuir a
renda e propiciar a todas as regiões um desenvolvimento econômico capaz de
superar os desequilíbrios e, efetivamente, gerar uma eficácia real-material,
isto é, tornar-se um instrumento de efetivação da justiça social. Em outras
palavras, busca-se, com o imposto de renda, instituir mecanismos que
possibilitem ultrapassarmos o espinhoso terreno entre a realidade formal
visível (igualdade meramente existente no plano ideológico) e a realidade
real-material (desejada) como medida real ao combate as desigualdades sociais.
Daí que o Brasil somente
conseguirá promover uma efetivação da justiça social, quando conseguir atingir
uma íntima relação entre a prestação de direitos
sociais e fundamentais que deve ser provido pelo Estado (saúde, educação,
segurança e outros) e a tributação (aqui, tratamos em especial o imposto de
renda), relação essa que visa garantir uma equidade entre Estado e Cidadão, promovendo
a dignidade da pessoa humana, na medida de sua capacidade contributiva e o
dever fundamental de pagar impostos.
1.2 A DIGNIDADE HUMANA COMO PREMISSA DE UM
IMPOSTO DE RENDA JUSTO E EFICAZ (NÃO MERAMENTE ARRECADADOR)
Perquirir
um caminho justo, solidário e equânime é um desafio a todo país que pretende
ser igualitário em todos os sentidos. É obrigação para um Estado que se diz Democrático de Direito. É dever de um
governo que institui impostos e, em contrapartida, deve oportunizar meios de
fornecer direitos sociais aos seus cidadãos.
Ao impor
limite de dedução das despesas com educação, o legislador não limita
apenas a mera sobrevivência física do contribuinte, numa ótica de redução
financeira claramente evidenciada nas desigualdades sociais existentes no
Brasil, mas sim, impõe limitação ao sentido de um pleno desenvolvimento da
personalidade humana e, também, ao próprio direito fundamental de uma existência
digna constitucionalmente prevista, ao passo que o gozo desta existência digna
não concretize a eficácia mínima que seu titular necessita, que é um direito à
educação que se permeie por toda a vida.
ÁVILA (2010. p. 332),
adverte que o Estado deve possuir meios de efetivar a proteção destes bens
sociais, quando assegura:
O dever de coerência
exige que exista uma principal relação de tensão entre a competência do Poder
Legislativo para instituir tributos e a dignidade humana e os direitos
fundamentais de liberdade de os sujeitos passivos desenvolverem sua propriedade
privada e sua iniciativa privada, em virtude da qual deve ser encontrada uma
harmonia entre interesses privados e públicos na determinação da carga
tributária. A preservação do direito à vida e à dignidade e da garantia dos
direitos fundamentais de liberdade alicerçam não apenas uma pretensão de defesa
contra restrições injustificadas do Estado nesses bens jurídicos, mas exigem do
Estado medidas efetivas para a proteção desses bens. O aspecto tributário dessa
tarefa é a proibição de tributar o mínimo existencial do sujeito passivo.
Nesta mesma linha, como
bem pondera MENKE (2008. p. 105), essa existência digna deve:
[...] não só ser
prestada aos indivíduos, mas, antes disso, que precisa ser protegida contra as
intervenções estatais. Essas condições estão explicitamente no bojo da carta
maior, que arrola os bens que exteriorizam as necessidades vitais básicas,
individuais e familiares, que são: moradia, alimentação, educação, saúde, que – à luz da Constituição Federal – estes bens
são o padrão básico para uma existência digna.
A dignidade humana é –
portanto – o alicerce do ordenamento jurídico Estatal
que
visa estancar as desigualdades históricas nas condições de acesso à educação, que
nas palavras de PINTO FILHO (
2010, f. 89), apesar de estar
disposto no início do texto constitucional, o princípio da dignidade humana, desdobra-se e irradia seus mandamentos por toda a
sua extensão, servindo, como se verá a seguir, como fundamento para
interpretação pelo aplicador do direito e é base de todo o sistema normativo
brasileiro, encontrados, seja expressa ou implicitamente, entre outros
dispositivos constitucionais no art. 227, art. 226, § 7º,
caput do art. 170, art. 23, X e art. 3º, III.
Cumpre
esclarecer que o tributo, para se tornar justo e válido, pelo menos sob a ótica
da igualdade, precisa, antes de tudo, ter uma relevância social
,
ou seja, precisa o Estado justificar sua carga de obrigatoriedade para a
cobrança que, no mais das vezes, é para suprir com as necessidades vitais do
ente estatal, a fim de promover a sua política de governança, bem como
proporcionar o mínimo necessário para que o cidadão possa se desenvolver como
indivíduo de uma sociedade igualitária e justa.
Ao
lecionar sobre a finalidade que se busca com a tributação, o professor FERREIRA
NETO (2006, f. 112), com
propriedade afirma:
Da mesma
forma como não é possível imaginar uma ação que não se proponha a nenhum fim,
também não há como se pensar na instituição de uma exigência tributária que
possa ser compreendida como absolutamente carente de finalidade. Isso significa
dizer que toda e qualquer espécie tributária possui minimamente uma finalidade
constitucional, mesmo nos casos em que esta não venha consagrada de modo
determinado. O que pode, na verdade, vir a diferenciar uma espécie da outra é o
grau de objetivação da finalidade que o Constituinte vinculou à instituição de
um tributo em particular.
Na mesma
linha, tecendo ponderações a respeito da dignidade da pessoa humana, como
requisito da tributação, a fim que essa guarde estreita vinculação entre aquilo
que o Estado possibilita e o mínimo vital que deve possibilitar ao cidadão
contribuinte, SANTOS (2006, f. 55), em sua dissertação de mestrado assevera:
Num
sentido positivo, o mínimo vital não se resume à garantia do direito à vida, de
modo a assegurar o direito a respirar ou meramente a existir, mas à proteção
das condições mínimas materiais para viver em dignidade. Tendo o indivíduo a
aspiração maior de crescimento econômico, social, político e religioso, ou
seja, de um crescimento integral, cabe ao Estado não só promover e facilitar essas
realizações, como também, no campo tributário, eliminar os obstáculos
impeditivos para a realização desse mínimo.
Considerando
que a CF/88, no art. 1º, III, invoca a dignidade humana como fundamento do
Estado brasileiro, o mínimo vital não pode ficar circunscrito às condições e
recursos de primeira necessidade ou a recursos financeiros que cubram as
necessidades vitais.
Ao
contrário, deve haver uma extensão de bens jurídicos para a existência e
desenvolvimento tanto do indivíduo como de sua família, pois o mínimo vital
sequer tem um conteúdo específico ou é mensurável, envolvendo mais aspectos de
qualidade do que de quantidade.
Portanto,
ao sopesar o direito social envolvido (direito à educação) e a tributação do
imposto de renda, o que se pretende é estabelecer critérios que atendam tanto
ao Estado, com sua necessária tributação do acréscimo patrimonial do cidadão,
assim como ao contribuinte que não pode se ver restringido em seu direito
constitucional de ter uma educação de qualidade, sob pena de impossibilitar a
construção de um país
socialmente justo.
Desta forma, o imposto de renda não pode impor limite à
dedutibilidade das despesas educacionais, pois o Estado não cumpre com o seu
dever de oferecer um acesso a Educação que seja extensiva a todos, em todos os
sentidos, isto é, uma educação que não maquie o real estado do ensino no país,
onde o problema agora não é mais vagas, uma vez que elas até existem nas
escolas, mas o que preocupa é baixa qualidade que o ensino é ofertado. Daí,
porque falar-se-á em acarretar
prejuízos substanciais à cidadania e dignidade humana do cidadão, haja vista
que a educação é um direito social inalienável da pessoa humana, logo, se o
Estado não propicia uma educação com qualidade, privando o cidadão contribuinte
daquilo que é
necessário aprender, deve – por óbvio – permitir a dedução com os gastos
educacionais, já que o ensino tem um papel fundamental na construção e formação
de sujeitos de direito, consolidando efetivamente um estado de justiça social e
democrático de direito.
Suplantado o tema quanto a conceituação constitucional de renda, da
pertinência de caracterizar a necessidade da eficácia real-material em torno do
imposto de renda e da obrigatoriedade de tê-lo como um imposto justo, eficaz e
concretizador da dignidade humana, é
preciso adentrar no campo da dedução das despesas com gastos educacionais
vigentes na Lei nº 9.250/95 e sua violação aos princípios constitucionais
tributários.
2 A DEDUÇÃO
VIGENTE NA LEI Nº 9.250/95 E A VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
TRIBUTÁRIOS
A Lei nº
9.250/95 alterou a legislação do imposto de renda das pessoas físicas,
instituindo em seu art. 8º, inciso II, alínea ‘b’, itens 7
,
8 e 9, as deduções cabíveis com instrução do contribuinte e seus dependentes,
da seguinte forma:
Art.
8º A base de cálculo do imposto devido no ano-calendário será a diferença entre
as somas:
II -
das deduções relativas:
b) a
pagamentos de despesas com instrução do contribuinte e de seus dependentes,
efetuados a estabelecimentos de ensino, relativamente à educação infantil,
compreendendo as creches e as pré-escolas; ao ensino fundamental; ao ensino
médio; à educação superior, compreendendo os cursos de graduação e de
pós-graduação (mestrado, doutorado e especialização); e à educação
profissional, compreendendo o ensino técnico e o tecnológico, até o limite
anual individual de:
7. R$ 3.091,35 (três mil, noventa e um reais e trinta
e cinco centavos) para o ano-calendário de 2012;
8. R$ 3.230,46 (três mil, duzentos e trinta reais e
quarenta e seis centavos) para o ano-calendário de 2013;
9. R$ 3.375,83 (três mil, trezentos e setenta e cinco
reais e oitenta e três centavos) a partir do ano-calendário de 2014;
A partir da dedutibilidade dos gastos com educação apresentada na Lei nº
9.250/95, ecoa a necessidade de averiguarmos se o limite existente na presente
norma jurídica é capaz de amparar constitucionalmente tais restrições. Ainda,
faz-se importante que tal dedução seja analisada tendo-se por base os princípios
constitucionais tributários, que são os mandamentos nucleares da nossa Carta
Política na área do direito tributário (DIFINI, 2008, p. 73), sendo que – desde logo, cabe referir que não se pretende dar uma
amplitude exaustiva aos vários princípios tributários aplicados ao estudo dos
tributos, isto porque em decorrência de um corte metodológico necessário,
busca-se fazer uso dos princípios tributários como um elemento constitutivo e
com pretensão de complementaridade (ÁVILA, 2012, p. 85), sob pena de perder o foco existencial deste
trabalho, qual seja: a utilização de parâmetros constitucionais que visem
efetivar o imposto de renda como um elo entre o Estado e o contribuinte, em
virtude dos impostos pagos, como forma de concretização da justiça social em
face dos direitos sociais que o Estado deve prover aos cidadãos ou permitir que
as despesas essenciais sejam deduzidas na integralidade, como meio de asseverar
uma dignidade do mínimo existencial, necessário para que o cidadão consiga
concretamente viver em sociedade.
2.1 PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E
A IMPRESCINDÍVEL OBSERVÂNCIA DO MÍNIMO VITAL
Na atual
sociedade brasileira onde reina uma variedade de classes econômicas, na qual
alguns são, sob o critério financeiro, tidos como abonados e outros, pelo
contrário, mal conseguem sobreviver, faz-se correto e justo, tanto pelo prisma
moral e jurídico, que contribuam de forma diferente. Quem pode mais, deve
proporcionalmente contribuir mais.
Lecionando sobre o tema, PAULSEN
(2013, p. 75) bem define essa capacidade contributiva econômica, quando diz
que:
Decorre deste
princípio, basicamente, que o Estado deve exigir das pessoas que contribuam
para as despesas públicas na medida da sua capacidade econômica, de modo que os
mais ricos contribuam progressivamente mais em comparação aos menos providos de
riqueza.
Essa
conceituação da capacidade contributiva está constitucionalmente prevista no
art. 145, § 1º, da Carta Magna, que reza:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter
pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte,
facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a
esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos
da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do
contribuinte.
Portanto,
deve o Estado nortear-se pela proporcionalidade e
igualdade da capacidade contributiva (expressão constante no
art. 145, § 1º, da Constituição Federal), como medida equitativa para a
contribuição de cada pessoa (contribuinte) com as despesas estatais, uma vez
que a tributação passa a ser o principal instrumento de concretização
dos direitos fundamentais por parte do Estado.
Possui o Estado o papel assistencialista, sendo que a fonte
de recursos deste é originada na arrecadação dos impostos da atividade exercida
por particulares, a fim de suportar e concretizar essa gama de direitos
fundamentais (saúde, educação, segurança, etc.). Daí a importância do princípio da capacidade contributiva quando exige
que o legislador e o operador do direito tratem igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais
,
isto é, nas palavras de ÁVILA (2010, p. 372), a capacidade contributiva é, na
verdade, um critério de aplicação da igualdade, que servirá de instrumento à
concretização dos direitos fundamentais de todo cidadão.
A existência humana digna pressupõe uma relação harmoniosa entre a
capacidade contributiva do contribuinte e a fixação, por parte do Estado, sobre
o que será tributado, sem que isso afete o mínimo existencial
necessário para que o cidadão possa realmente usufruir dos direitos sociais e
fundamentais balizadores de uma vida em sociedade. Isto é, a capacidade
econômica, do ponto de vista subjetivo, somente se inicia após a dedução das
despesas necessárias para a manutenção de uma existência digna para o
contribuinte e sua família (BALEEIRO, 1998, p. 693).
O mínimo existencial, esclarece DUTRA (2010, p. 109), deve – de acordo
com o texto constitucional – abranger a garantia de atendimento das
necessidades vitais básicas, na qual somente depois de atendidas tais
necessidades, pode o cidadão ser apontado como possível contribuinte, antes não;
e deve o legislador garanti-los, sob pena de ofensa ao princípio da capacidade
contributiva.
Por derradeiro, com base no exposto, busca-se demostrar que somente
haverá uma eficácia dos direitos sociais prestacionais obrigatórios pelo
Estado, em particular, o direito a uma educação de qualidade, que possibilite
uma condição digna ao cidadão, na medida em que essa concretamente for prestada
pelo ente estatal, caso contrário tem-se uma transgressão originada na violação
da capacidade contributiva do cidadão contribuinte que sofre uma repercussão
financeira, mas vê-se suprido de efetivamente desfrutar de uma educação
satisfatória, digna e revestida de alicerce fundamental que assegure o mínimo
existencial necessário para satisfação pessoal e social do cidadão.
2.2 PRINCÍPIO
DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE COMO CRITÉRIO LIMITADOR AO DIREITO DE
TRIBUTAR
O Estado, como já referido, precisa dos impostos para poder prover o rol
de direitos que o cidadão, dentro de uma sociedade, precisa para viver com
dignidade, esta compreendida tanto individualmente, quanto coletivamente, sendo
que essa arrecadação deve pautar-se na obediência e garantia dos princípios
constitucionais da proporcionalidade e razoabilidade, isto significa dizer que o Estado não deve gravar a renda do
contribuinte, de forma que dificulte a promoção do mínimo
existencial necessário à sobrevivência digna do cidadão.
Deste modo, quando impõe ao contribuinte do imposto
de renda a limitação da dedução das despesas educacionais, acaba o legislador
impondo ao cidadão um encargo econômico maior do que este deve suportar, uma
vez que o Estado não possibilita meios eficazes de perfectibilizar o direito
social à educação, estampado no nosso Texto Constitucional nos arts. 6º e 205,
violando deste modo a devida proporcionalidade e a razoabilidade entre o
sacrifício econômico exigido do contribuinte e a obrigatoriedade do imposto de
renda devido. Proporcionalidade esta que, no entender de SANTOS (2006, f. 33), se dá como proporção ou desproporção da norma
tributária, quando ensina:
Do resultado da ponderação entre o
sacrifício econômico exigido do contribuinte e uma maior realização da
finalidade tributária, é que surge a proporção ou desproporção – a norma
tributária obedecerá à proporcionalidade se a finalidade constitucional a que é
dirigida corresponder à restrição produzida na liberdade ou na propriedade do
contribuinte; ao contrário haverá desproporção se o fim a que se deseja valer
imponha um encargo econômico maior ao contribuinte do que este deve sofrer. A
avaliação da suportabilidade maior ou menor do encargo sofrido tanto pode
partir da relação que tem esse encargo com a finalidade da norma tributária,
quanto das condições pessoais do contribuinte.
ÁVILA (2012, p. 173-182) explica que a proporcionalidade exige que o Poder Legislativo
e o Poder Executivo escolham, para a realização de seus fins, meios adequados
necessários e proporcionais. Adequado se promove um fim. Necessário se, dentre
todos aqueles meios igualmente adequados, for o menos restritivo relativamente
aos direitos fundamentais. E será proporcional, se as vantagens que promove
superam as desvantagens que provoca. Por sua vez, a razoabilidade é (um)
utilizada como diretriz que exige a relação das normas gerais com as
individualidades do caso concreto, (dois) empregada como diretriz que exige uma
vinculação das normas jurídicas com o mundo ao qual elas fazem referência e
(três) é utilizada como diretriz que exige a relação de equivalência entre duas
grandezas.
Desta forma, não nos utilizamos dos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade como sinônimos, mesmo que a jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal o faça, pois como vimos acima, não o são, mas sim
utilizamo-nos como critérios de adequação e construção da interpretação e
aplicação do direito (DIFINI, 2005, f. 139-140).
No que tange a utilização dos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade como critérios limitadores ao direito de
tributar, matéria prevista nos art. 150 a 152 da Constituição Federal, o
Supremo Tribunal Federal, quando do Julgamento da ADI 712/DF
,
cujo relator foi o ministro Celso de Mello, salientou que:
O exercício do poder tributários, pelo
Estado, submete-se, por inteiro, aos modelos jurídicos positivados no texto
constitucional que, de modo explícito ou implícito, institui em favor dos
contribuintes decisivas limitações à competência estatal para impor exigir,
coativamente, as diversas espécies tributárias existentes.
Os princípios constitucionais
tributários, assim, sobre, sobre representarem importante conquista político-jurídica
dos contribuintes, constituem expressão fundamental dos direitos individuais
outorgados aos particulares pelo ordenamento estatal. Desde que existem para
impor limitações ao poder de tributar do Estado, esses postulados têm por
destinatário exclusivo o poder estatal, que se submete à imperatividade de suas
restrições.
A proporcionalidade e razoabilidade almejada na
norma tributária visam a perseguição de um fim tributário que não acarrete a
impossibilidade de promoção dos direitos fundamentais e sociais, em especial o
direito à educação, sob pena de a atividade tributária (limitação da dedução
das despesas educacionais imposta pela Lei nº 9.250/95), ser caracterizada como
excessiva, uma vez que evidencia a restrição dos bens jurídicos protegidos pelo
núcleo essencial dos direitos fundamentais (MENKE, 2008. p. 76).
2.3 PRINCÍPIO DO NÃO-CONFISCO E A
IMPORTÂNCIA LATENTE DO DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR IMPOSTOS
O princípio do não-confisco é expressamente
previsto no art. 150, IV, da Constituição Federal, que prevê:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas
ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios:
IV - utilizar tributo com
efeito de confisco;
Debruçando-se sobre o tema, o mestre CARRAZZA (2009,
p. 118), com autoridade e inteligência que lhe
é perspicaz, conceitua o caráter confiscatório do tributo, quando salienta que:
Ao nosso sentir, é confiscatório o
tributo que, por assim dizer, esgota (ou tem a potencialidade de esgotar) a
riqueza tributável das pessoas, isto é, que não leva em conta sua capacidade
contributiva. Ou, se preferirmos: quando ignora a aptidão de uma pessoa, física
ou jurídica, de entregar parte da riqueza que possui, sem comprometer sua
subsistência.
Novamente, fazendo-se uso do ensinamento de DIFINI
(2008, p. 87), para quem o estudo do não-confisco é
ainda incipiente na nossa doutrina, bem como tímida na jurisprudência, onde,
deverá o juiz, em cada caso concreto, ir cunhando parâmetros para decidir se
configurada (ou não) infração desproporcional ao princípio da capacidade
contributiva, de molde a caracterizar tributação com efeito de confisco, é que
se faz pertinente o estudo e análise do princípio do não-confisco, juntamente
com o dever fundamental de pagar impostos, tese trazida a baila pelo ilustre professor português NABAIS (2007, p.190),
quando parte do raciocínio em
que vivemos em um Estado Fiscal, no qual se constata que todos os direitos possuem custos e que onde todos
temos a qualidade de destinatários do dever fundamental de pagar
impostos na medida da respectiva capacidade contributiva. Portanto, para
vivermos em sociedade todos devemos arcar com este preço (pagar impostos).
Logo, a pergunta que se faz é: se na medida em que todos têm a
obrigatoriedade de pagar impostos, a limitação da dedução das despesas
educacionais imposta pela Lei nº 9.250/95 é ou não tida como confiscatória? Essa
limitação imposta pela legislação afeta – concretamente – a eficácia mínima dos
direitos fundamentais do cidadão em buscar uma educação com qualidade? A nosso
ver sim, vejamos.
É bem verdade que o princípio do não-confisco e o dever fundamental de
pagar impostos (enraizado a partir da capacidade contributiva), navegam sob as
mesmas águas turvas, uma vez que os impostos exijam dos contribuintes um
montante de riqueza ou de rendimento superior ou igual ao que constitui a
correspondente matéria coletável, o que é óbvio, pois que, para haver imposto é
necessário que haja riqueza, e para haver imposto num estado fiscal, impõe-se
que este não esgote a respectiva capacidade contributiva do cidadão, o que
caracterizaria um claro ato confiscatório, no qual o conjunto dos direitos e
garantias fundamentais do cidadão também podem e devem ser chamados à colação
para atuarem como limite superior da fixação do imposto (NABAIS, 2009, p.465).
Sobre o viés confiscatório do imposto sobre a renda e proventos de
qualquer natureza, CARRAZZA (2009. p. 125) destaca o difícil momento de se
constatar a confiscatoriedade, mas adverte que no caso concreto o Judiciário
poderá declarar inconstitucional, ao afirmar que:
É certo que, a
priori, é impossível precisar a partir de que ponto o IR assume viés
confiscatório. A análise, porém, de cada caso concreto, tendo em conta os
princípios da igualdade, da capacidade contributiva, da função social da
propriedade e da dignidade de pessoa humana, tem força bastante para revelar se
atingiu as raias do confisco – hipótese em que o Poder Judiciário, devidamente
provocado, declarará inconstitucional a lei irrazoável que o criou.
Por derradeiro, a limitação da dedução das despesas educacionais no
imposto de renda, imposta pela Lei nº 9.250/95, mostra-se excessivamente
onerosa a ponto de inviabilizar a concretização do rol de direitos sociais e
individuais necessários para que um cidadão possa efetivamente sentir-se
inserido perante a sociedade. Isto é, percebe-se que um dos valores básicos
fundamentais do Estado Democrático de Direito, qual seja: a responsabilidade e
a solidariedade social, aquela do cidadão para com o seu semelhante, mas
igualmente a do Estado para com a sociedade (LINARAe COSTA, 2011, p. 150), não se
perfectibiliza. Portanto, não se quer, com a proibição do não-confisco,
outorgar uma proteção absoluta contra a incidência do tributo, uma vez que
tem-se a plena inteligência que possui sim o contribuinte o dever fundamental
de pagar impostos (AMARO, 2008, p. 144), claro – que por óbvio – dentro da sua
capacidade contributiva, ou se estaria anulando o poder de Tributar do Estado.
Assim, razão pela qual não há outra conceituação a não ser aquela de
caracterizar a limitação da dedução das despesas educacionais no imposto de
renda como confiscatória, haja vista que essa limitação impede a realização do
valor de justiça do sistema tributário
.
3. A INCONSTITUCIONALIDADE DE IMPOR LIMITE
NA DEDUÇÃO DOS GASTOS COM EDUCAÇÃO: UMA ANÁLISE A PARTIR DO ENFOQUE
CONSTITUCIONAL AO DIREITO À EDUCAÇÃO ORIUNDA DA OMISSÃO ESTATAL EM POSSIBILITAR
O REAL DIREITO À EDUCAÇÃO
Na trilha de uma vida digna, com condições humanas dignas, faz-se
necessário que o Estado propicie ao cidadão contribuinte medidas concretas para
que ele possa desfrutar dos direitos constitucionais expressamente previstos no
rol do art. 6º
, da
Carta Política de 1988, entre eles, o direito social à educação que é direito
de todos e dever do Estado (glorificado no art. 205
,
do nosso Texto Constitucional), caso contrário estaremos diante de uma omissão
estatal.
Desta monta, constata-se que a Lei nº 9.250/95, ao limitar a
dedutibilidade dos gastos do contribuinte com educação, cujas despesas são em
decorrência direta de omissão do Estado em efetivamente cumprir dever que a
Constituição impôs (art. 6º e 205, CF), é inconstitucional, uma vez que tais
despesas caracterizam-se como essenciais à vida do cidadão. Neste sentido,
valemo-nos das palavras de CARNEIRO (2012, p. 32-53), para quem a omissão
Estatal acarreta a inconstitucionalidade da norma:
Assentadas a imprescindibilidade do sistema de
deduções e a carência de liberdade da lei na matéria, podemos agora afirmar sem
receio de errar que existe um critério objetivo a ser seguido na identificação
das despesas dedutíveis para fins do IRPF e do qual não pode fugir o legislador
ordinário sem que cais no fosso da inconstitucionalidade: são dedutíveis
aqueles gastos realizados pelo contribuinte em função do descumprimento, pelo
Estado, de dever constitucionalmente lhe imposto.
...Assim, o direto à educação no âmbito do Imposto de
Renda Pessoa Física surge do inadimplemento estatal para com um dever
prestacional de caráter social que acarreta o surgimento de despesa em que o
particular não teria incorrido caso o comando constitucional correspondente
houvesse sido devidamente observado pelo seu destinatário: o Estado.
Nesta senda, o Poder
Judiciário, através do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (São Paulo), ao
julgar a Arguição de Inconstitucionalidade Cível nº
0005067-86.2002.4.03.6100/SP (suscitada pela Sexta Turma desta Corte em sede de
apelação em mandado de segurança impetrado com a finalidade de garantir o
direito à dedução integral dos gastos com educação na Declaração de Ajuste
Anual do Imposto de Renda Pessoa Física de 2002, ano-base 2001, ainda pendente de
análise de admissibilidade
do
recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal), destacou que a
educação é um direito social fundamental, sendo dever jurídico do Estado
promovê-la, na qual a incidência do imposto sobre gastos com educação vulnera o
conceito constitucional de renda e o princípio da capacidade contributiva, assim ementado:
CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PESSOA
FÍSICA. LIMITES À DEDUÇÃO DAS DESPESAS COM INSTRUÇÃO. ARGUIÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 8º, II, "B", DA LEI Nº 9.250/95.
EDUCAÇÃO. DIREITO SOCIAL FUNDAMENTAL. DEVER JURÍDICO DO ESTADO DE PROMOVÊ-LA E
PRESTÁ-LA. DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO. NÃO TRIBUTAÇÃO DAS VERBAS DESPENDIDAS COM
EDUCAÇÃO. MEDIDA CONCRETIZADORA DE DIRETRIZ PRIMORDIAL DELINEADA PELO CONSTITUINTE
ORIGINÁRIO. A INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE GASTOS COM EDUCAÇÃO VULNERA O
CONCEITO CONSTITUCIONAL DE RENDA E O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA.
1. Arguição de inconstitucionalidade suscitada pela e.
Sexta Turma desta Corte em sede de apelação em mandado de segurança impetrado
com a finalidade de garantir o direito à dedução integral dos gastos com
educação na Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda Pessoa Física de
2002, ano-base 2001.
2. Possibilidade de submissão da quaestio juris a este
colegiado, ante a inexistência de pronunciamento do Plenário do STF, tampouco
do Pleno ou do Órgão Especial desta Corte, acerca da questão.
3. O reconhecimento da inconstitucionalidade da norma
afastando sua aplicabilidade não configura por parte do Poder Judiciário
atuação como legislador positivo. Necessidade de o Judiciário – no exercício de
sua típica função, qual seja, averiguar a conformidade do dispositivo impugnado
com a ordem constitucional vigente - manifestar-se sobre a compatibilidade da
norma impugnada com os direitos fundamentais constitucionalmente assegurados.
Compete também ao poder Judiciário verificar os limites de atuação do Poder
Legislativo no tocante ao exercício de competências tributárias impositivas.
4. A CF confere especial destaque a esse direito
social fundamental, prescrevendo o dever jurídico do Estado de prestá-la e
alçando-a à categoria de direito público subjetivo.
5. A educação constitui elemento imprescindível ao
pleno desenvolvimento da pessoa, ao exercício da cidadania e à livre
determinação do indivíduo, estando em estreita relação com os primados
basilares da República Federativa e do Estado Democrático de Direito, sobretudo
com o princípio da dignidade da pessoa humana. Atua como verdadeiro pressuposto
para a concreção de outros direitos fundamentais.
6. A imposição de limites ao abatimento das quantias
gastas pelos contribuintes com educação resulta na incidência de tributos sobre
despesas de natureza essencial à sobrevivência do indivíduo, a teor do art. 7
º, IV, da CF, e obstaculiza o exercício desse direito.
7. Na medida em que o Estado não arca com seu dever de
disponibilizar ensino público gratuito a toda população, mediante a
implementação de condições materiais e de prestações positivas que assegurem a
efetiva fruição desse direito, deve, ao menos, fomentar e facilitar o acesso à
educação, abstendo-se de agredir, por meio da tributação, a esfera
jurídico-patrimonial dos cidadãos na parte empenhada para efetivar e
concretizar o direito fundamental à educação.
8. A incidência do imposto de renda sobre despesas com
educação vulnera o conceito constitucional de renda, bem como o princípio da
capacidade contributiva, expressamente previsto no texto constitucional.
9. A desoneração tributária das verbas despendidas com
instrução configura medida concretizadora de objetivo primordial traçado pela
Carta Cidadã, a qual erigiu a educação como um dos valores fundamentais e
basilares da República Federativa do Brasil.
10. Arguição julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade
da expressão "até o limite anual individual de R$ 1.700,00 (um mil e
setecentos reais)" contida no art. 8º, II, "b", da Lei nº
9.250/95.
No mesmo passo da acertada decisão do Tribunal
Regional Federal da 3ª Região, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil – CFOAB, ingressou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.927,
perante o Supremo Tribunal Federal, ainda pendente de julgamento
,
pois ciente que ao proibir que o contribuinte faça o abatimento da
integralidade das despesas com instrução própria e de seus dependentes,
impedindo-o de deduzir qualquer importância que exceda o limite legal
autorizado, que frisa-se, é um limite vergonhoso e irrisório, o legislador
ordinário acabou por subverter o conceito constitucional de renda
,
o que acaba – deste modo - fazendo-se obrigatório a declaração de
inconstitucionalidade do art. 8º, alínea
b, itens 7, 8 e 9, da Lei 9.250/90, pois a proibição de dedução integral das despesas de
instrução efetivamente incorridas pelo contribuinte revela-se incompatível com
o dever imposto ao Poder Público, pela Carta da República de 1988, na qual a
educação é
direito de todos e dever do
Estado (art. 205, CF), sendo que a este cabe o dever de promover e
incentivar o ensino, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa humana, que consequentemente
lhe proporcionará o seu integral exercício da cidadania e lhe qualificará para
o trabalho, incluindo-o na vida em
sociedade.
Deste modo, nota-se que a
limitação da dedução dos gastos com educação acaba por ferir o mínimo
existencial previsto no texto constitucional, principalmente, gravado no
princípio da dignidade da pessoa humana e, consequentemente, não atinge a
Justiça Fiscal (na qual os tributos não podem ter o caráter confiscatório e
cada cidadão contribui a partir da sua capacidade contributiva), bem como a
Justiça Social (aquela que visa proporcionar uma igualdade social entre os
sujeitos de direitos, possibilitando melhores condições de vida e, aqui,
relaciona-se os direitos sociais à moradia, educação, saúde, lazer, etc.),
razão pela qual constata-se a omissão estatal em possibilitar o real direito à
educação, haja vista a realidade social da população brasileira, na qual o
salário mínimo não consegue – nem de longe – suprir as
necessidades básicas de um cidadão
,
ao passo que o princípio da capacidade contributiva em relação ao reajuste
anual da tabela de deduções das despesas de educação prevista no Imposto de
Renda não corresponde à realidade.
Logo, ao não concretizar
os preceitos constitucionais que regem os direitos sociais e individuais do
cidadão, o Estado, seja por sua ação (impor limite irrisório e deslocado da
realidade social nas despesas com educação) ou omissão, por não oferecer acesso
para uma educação de qualidade a todos, o mesmo não pratica uma efetiva justiça
social, pois restringe a dedutibilidade das despesas necessárias à manutenção
do mínimo existencial vital para que o cidadão possa sentir-se inserido dentro
da sociedade, fulminando os princípios e garantias estabelecidas na
Constituição Federal.
Portanto, para que se
possam acatar eficazmente os preceitos de uma justiça tributária, visando assim
instituir uma justiça social além do imaginário estabelecido no papel, faz-se
necessário uma alteração da realidade atual, a fim que se permita a dedução das
despesas efetivamente gastas com educação da base de cálculo do imposto sobre a
renda e proventos de qualquer natureza, tendo em vista que, da forma como hoje
se encontra prevista (limitação dos gastos com educação do contribuinte e seus
dependentes, elencados do art. 8º, alínea b,
itens 7, 8 e 9,
da Lei 9.250/90), é claramente inconstitucional, pois além de descumprir
com os mandamentos constitucionais dos princípios da capacidade contributiva,
não-confisco e mínimo existencial, acaba por tributar valores que não se
inserem no conceito constitucional de renda, uma vez que tais despesas não se
encaixam na caracterização do
imposto de renda que se dá a partir do acréscimo patrimonial que o
cidadão efetivamente tenha auferido.
4 CONCLUSÃO
Com o avanço do Estado Democrático
de Direito, em especial a partir da promulgação da Constituição Federal de
1988, os diretos fundamentais sociais se tornaram o ponto
fundamental de uma vida digna, na qual o seu real reconhecimento é a base
essencial da efetiva concretização desses direitos, sem o qual ainda
permaneceremos no vácuo da dignidade humana norteadora de uma justiça social
incapaz de enfrentar as omissões estatais em áreas como a saúde, educação, moradia,
segurança, entre outras.
Assim, o Estado Brasileiro, estampado no Preâmbulo do seu texto máximo,
expressamente assegura o exercício dos direitos sociais e individuais de sua
população, na qual encontra-se centralizado a questão da dedutibilidade das
despesas educacionais no Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer
Natureza, haja vista que a Lei
nº 9.250/95, em especial os art. 8º, inciso II, alínea b, itens 7, 8 e 9, que estabelece
valores irrisórios e que não correspondem com a realidade atual da sociedade
brasileira, bem como que a caracterização do imposto de renda dá-se a partir do
acréscimo patrimonial do cidadão efetivamente
auferido pelo contribuinte num determinado lapso de tempo, sem o qual
inexistirá obrigação tributária.
Logo, da forma como está
posta a Legislação infraconstitucional, Lei 9.250/95, constata-se que é
preciso enfrentar e superar a natureza confiscatória do imposto de renda, sob
pena de não conseguir desatar o entrave à implementação de um Estado Social
justo e equânime a todos os cidadãos, isto é, não se pode aceitar um mero
discurso de direito de igualdade formal posto nas mais diversas leis que nosso
Estado promulga, faz-se necessário e imperioso proporcionar ao cidadão,
contribuinte do imposto, uma condição de preservar o mínimo existencial,
possibilitando – desta forma – a real efetivação da justiça social.
Nota-se, que ao passo que
o Estado necessita do tributo como forma de sustentáculo de sobrevivência, também
necessita de tais recursos para alcançar seus fins governamentais, isto é, deve um governo que institui impostos oportunizar
meios de o Cidadão usufruir destes direitos sociais, caso contrário os
impostos serão apenas uma fonte arrecadadora, incapaz de ser um mecanismo justo
e igualitário.
Deste modo, da maneira em
que está disposto o limite de dedução das despesas
com educação, o legislador não limita apenas a mera sobrevivência física do
contribuinte, uma vez que ao afastar a relação
harmoniosa entre a capacidade contributiva do contribuinte e a fixação, por
parte do Estado, sobre o que será tributado, tem-se um rompimento da existência
humana digna de uma vida em sociedade com foco a partir do direito a uma
educação de qualidade que visa proporcionar uma real inserção do cidadão no
contexto de sociedade.
Portanto, como se vê, a limitação da dedução das despesas
educacionais no imposto de renda, imposta pela Lei nº 9.250/95, mostra-se
excessivamente onerosa a ponto de inviabilizar a concretização do rol de
direitos sociais e individuais necessários para que o cidadão possa
efetivamente sentir-se inserido perante a sociedade, haja vista a violação da capacidade contributiva do
cidadão contribuinte que sofre uma repercussão financeira, mas vê-se suprido de
efetivamente desfrutar de uma educação satisfatória (direito este estampado no nosso Texto Constitucional nos arts.
6º e 205), digna e revestida de
alicerce fundamental que assegure o mínimo existencial necessário para
satisfação pessoal e social do cidadão.
Diante de tudo, torna-se compreensível a caracterização da limitação da
dedução das despesas educacionais no imposto de renda como confiscatória, haja
vista que essa limitação impede a realização do valor de justiça do sistema
tributário.
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Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em
Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional,
com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus,
a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
Faz-se, aqui, um adendo quanto ao entendimento do Supremo
Tribunal Federal, que a partir da ADI 2.076, passou a dizer que o
preâmbulo existente na Carta Magna não se situa no âmbito do Direito, mas no
domínio da política, refletindo posição ideológica do constituinte, não
contendo, portanto, relevância jurídica.
Como bem
ensina Luiz
Gustavo Faria de Azevedo Branco: Exige-se, em relação ao princípio da isonomia,
que a legislação seja idêntica para contribuintes em situações semelhantes.
Esta igualdade inadmite que o legislador estabeleça diferenciações, sem
qualquer justificação plausível, notadamente impondo tratamento fiscal mais
oneroso, baseado numa capacidade contributiva meramente potencial ou ideal de
determinados contribuintes, completamente distanciados da realidade objetiva.
(BRANCO, Luiz Gustavo Faria de Azevedo. O Dever de
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Pós-Graduação stricto sensu em Direito, Pontifícia Universidade Católica
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A noção de mínimo existencial ou mínimo vital,
encontra-se ampara na Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada em 10 de dezembro de 1948 na Assembleia
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